quarta-feira, 22 de agosto de 2007

Uns versinhos de merda.


De Telga Lima

Desculpem-me, mas o caralho dessa solidão, desse vazio, desse desamor, desses ridículos humanóides, debilóides. Às vezes ela, a solidão, protagonista deste texto, vem do nada, vem com tudo, vem de um oco que já está instalado, vem de uma noite gélida ou de uma dor de estômago, ou de uma dor de barriga. Alguém já teve dor de barriga de raiva, de solidão, de medo de alguma coisa? A dor de barriga do medo. A dor de barriga da merda. Uma buceta de uma dor, de algo que dói, dói e dói, no peito dos burros sensíveis, dos sensíveis burros, donos de nenhum burgo. Donos de nada, nem ao menos do seu próprio ser ou das rédias do sentido que se deve dar a alguma coisa. Que coisa!
Que porra é essa, que machuca que não podemos esmagar com as mãos, cuspir?
É loucura total, é um back ao inverso, o que não deixa de ser uma fumaça que queima neurônios em busca de calmantes. Espera, tenho que ir ao banheiro agora. Estou com uma puta de uma dor de barriga.


Hino à dor
Augusto dos Anjos

Dor, saúde dos seres que se fanam,
Riqueza da alma, psíquico tesouro,
Alegria das glândulas do choro
De onde todas as lágrimas emanam..

És suprema! Os meus átomos se ufanam
De pertencer-te, oh! Dor, ancoradouro
Dos desgraçados, sol do cérebro, ouro
De que as próprias desgraças se engalanam!

Sou teu amante! Ardo em teu corpo abstrato.
Com os corpúsculos mágicos do tacto
Prendo a orquestra de chamas que executas...

E, assim, sem convulsão que me alvorece,
Minha maior ventura é estar de posse
De tuas claridades absolutas!

terça-feira, 7 de agosto de 2007


Por Telga Lima
Um poema, Um resumo
Aos que prendem-se,fecham-se, guardam-se,enclausuram-se.
Aos que não levam consigo os seus sonhos mais loucos,
Para os loucos, que ousam não ousar.
Que ousam não amar.
Para os que morrem devagar, por que esquecem de viver, por que esquecem do tempo que resta.
Para os que abortam suas idéias,
Para os que não batem suas asas.
Para os que explodem sua pressão, para os que não deixam o ar entrar.
Aos que resumem-se.


O poema abaixo é pertinente para as coisas que pensava esses dias. É um poema meio longo, mas de uma verdade forte. Presente.

Pra vocês:
Poemas do livro Pensamento do Chão, poemas em prosa e verso. Reproduzidos, sob autorização da autora.
Viviane Mosé.

quem tem olhos pra ver o tempo soprando sulcos na pele soprando sulcos na pele soprando sulcos?
o tempo andou riscando meu rosto
com uma navalha fina

sem raiva nem rancor
o tempo riscou meu rosto
com calma

(eu parei de lutar contra o tempo
ando exercendo instantes
acho que ganhei presença)
acho que a vida anda passando a mão em mim.
a vida anda passando a mão em mim.
acho que a vida anda passando.
a vida anda passando.
acho que a vida anda.
a vida anda em mim.
acho que há vida em mim.
a vida em mim anda passando.
acho que a vida anda passando a mão em mim

e por falar em sexo quem anda me comendo
é o tempo
na verdade faz tempo mas eu escondia
porque ele me pegava à força e por trás

um dia resolvi encará-lo de frente e disse: tempo
se você tem que me comer
que seja com o meu consentimento
e me olhando nos olhos acho que ganhei o tempo
de lá pra cá ele tem sido bom comigo
dizem que ando até remoçando

muitas doenças que as pessoas têm são poemas presos
abscessos tumores nódulos pedras são palavras
calcificadas
poemas sem vazão
mesmo cravos pretos espinhas cabelo encravado
prisão de ventre poderia um dia ter sido poema
pessoas às vezes adoecem de gostar de palavra presa
palavra boa é palavra líquida
escorrendo em estado de lágrima

lágrima é dor derretida
dor endurecida é tumor
lágrima é alegria derretida
alegria endurecida é tumor
lágrima é raiva derretida
raiva endurecida é tumor
lágrima é pessoa derretida
pessoa endurecida é tumor
tempo endurecido é tumor
tempo derretido é poema
palavra suor é melhor do que palavra cravo
que é melhor do que palavra catarro
que é melhor do que palavra bílis
que é melhor do que palavra ferida
que é melhor do que palavra nódulo
que nem chega perto da palavra tumores internos
palavra lágrima é melhor
palavra é melhor
é melhor poema

receita para arrancar poemas presos:

você pode arrancar poemas com pinças
buchas vegetais. óleos medicinais
com as pontas dos dedos. com as unhas
com banhos de imersão
com o pente. com uma agulha
com pomada basilicão
alicate de cutículas
massagens e hidratação

mas não use bisturi nunca
em caso de poemas difíceis use a dança.
a dança é uma forma de amolecer os poemas
endurecidos do corpo.
uma forma de soltá-los
das dobras dos dedos dos pés. das vértebras
dos punhos. das axilas. do quadril

são os poema cóccix. os poema virilha
os poema olho. os poema peito
os poema sexo. os poema cílio

ultimamente ando gostando de pensamento chão
pensamento chão é poema que nasce do pé
é poema de pé no chão
poema de pé no chão é poema de gente normal
gente simples
gente de espírito santo

eu venho do espírito santo
eu sou do espírito santo
traga a vitória do espírito santo

santo é um espírito capaz de operar milagres
sobre si mesmo