quinta-feira, 29 de maio de 2008

"As idéias, elas não têm pureza, são sujas de humano, sujas de mundo. Filhas dos erros, como também dos erros são filhas as poucas e efêmeras perfeições que atingimos ao longo da vida. Erros são degraus e portas e portais, se nós tivermos coragem para reconhecê-los e ultrapassá-los".
CARMEN VASCONCELOS

PABLO NERUDA

Roubei lá do substantivo plural, esse belíssimo poema de Neruda. Um dos mais importantes poetas do século XX.

A noite na ilha
Dormi contigo a noite inteira junto do mar, na ilha.
Selvagem e doce eras entre o prazer e o sono, entre o fogo e a água.
Talvez bem tarde nossos sonos se uniram na altura e no fundo, em cima como ramos que um mesmo vento move, embaixo como raízes vermelhas que se tocam.
Talvez teu sono se separou do meu e pelo mar escuro me procurava como antes, quando nem existias, quando sem te enxergar naveguei a teu lado e teus olhos buscavam o que agora - pão, vinho, amor e cólera - te dou, cheias as mãos, porque tu és a taça que só esperava os dons da minha vida.
Dormi junto contigo a noite inteira, enquanto a escura terra gira com vivos e com mortos, de repente desperto e no meio da sombra meu braço rodeava tua cintura.
Nem a noite nem o sonho puderam separar-nos.
Dormi contigo, amor, despertei, e tua boca saída de teu sono me deu o sabor da terra, de água-marinha, de algas, de tua íntima vida, e recebi teu beijo molhado pela aurora como se me chegasse do mar que nos rodeia.

terça-feira, 27 de maio de 2008

Cravado Feito Alfinete

Por Carmen Vasconcelos
Pensando em escrever sobre o começo do amor, lembrei uns versos de Eugênio Montale. Quando eu digo lembrei, quero dizer, eles vieram, os versos, e esta é a relação de maior prazer que tenho com a poesia: quando versos vêm por eles mesmos, por fragmentos, quando eles se escolhem, não eu, embora venham para atender uma necessidade minha. Aí a lembrança é só satisfação. Ah, eu falava dos versos de Montale. Não foi fácil achá-los hoje, preciso ler mais meu poeta. Enfim, encontrei-os. São do poema Götterdämmerung: “os inícios são sempre irreconhecíveis/ quando se constata alguma coisa é porque ela já/ está cravada como um alfinete”. O poema não fala de inícios de amor, mas penso que esses versos traduzem a obscuridade e confusão do começo da relação amorosa. Pelo menos me chegaram quando eu divagava sobre a floração do sentimento de amor, sobre os momentos nos quais, assaltados e sobressaltados por ebulições que nos tiram do eixo e não sabemos para onde vão nos levar, somos tomados pela insegurança. Digo com a palavra amor o que muita gente diz com outros nomes. É que não concebo o amor diferenciado, discriminado, dissecado. Nunca vi sentido em separar amor de paixão e muito menos em vê-los como sentimentos antagônicos. O que aqui chamo de amor é talvez o que outros chamem paixão ou entusiasmo ou encantamento. Ou feitiço. Ou vodu. Para mim, é amor. E amor, mesmo cortante, crava-o em nós um deus. Então, vamos a Eros, o começo. Eros, o “demônio poderoso”, regente daquele período no qual, sem pedir licença, uma pessoa toma posse do nosso pensamento. Estabelecemos não uma, mas duas relações: com o outro e com o sentimento do outro, esse que se volatiliza. Esse que nos inquieta: amamos. Somos amados? Nem deus sabe. Pudéssemos estar certos da força, da perenidade, da verdade do amor do outro, conheceríamos calmaria. Pudéssemos adivinhar se amanhã o amor do outro estará arrefecido, acionaríamos os nossos mecanismos de recuo enquanto os temos, se é que ainda os temos, pois também eles se volatilizam quando menos esperamos. É todo inquietação o começo do amor. A amiga ensina um “mantra” para acalmar: “seja intenso enquanto dure”. E quando o fantasma da perda perturba a repetição do mantra? Quando o telefone não basta, o torpedo no celular não basta, o e-mail não basta? Resta-nos apelar ao místico poeta: valei-me, São João da Cruz, nessa “doença de amor que só se cura/ com a presença e com a figura”. A ansiedade pela figura fez o bardo Orfeu perder a amada. Para resgatá-la da morte, ele precisava acreditar que ela estava atrás dele, porque isso lhe dissera a deusa dos infernos, mas não podia olhar para trás, tinha de confiar. Mas basta a só impressão da ausência do outro para nos esvaziar, o amor roga contemplação e toque. Ao virar-se para ver sua Eurídice, Orfeu desobedeceu à deusa, e a imagem da amada desapareceu para sempre. Condenaríamos Orfeu? Não, o amor, ainda mais no começo, conjuga o verbo pegar. Então, que amor se chamaria amor, se não ousasse desobediência? Desobediência, risco, incerteza... Ou você ama, ou constrói escapes. Quando nos damos conta, o amor já está cravado como alfinete ou flecha, destilando a insegurança que o mineiro Celso Adolfo tão bem decantou, na canção “Nós dois”: “e nós que nem sabemos quanto nos queremos/ que nem sabemos tudo que queremos/ como é difícil o desejo de amar/ (...) e nós que nem soubemos nos querer de vez/ estamos sós, laçados em dois nós...”

segunda-feira, 26 de maio de 2008


Por Telga Lima.

Leve, muito leve, pneumática e, a vida corre.
Sem um sentido escrito, descrito, script.

Só respiração, sopro no peito, assobio de assobiar.
Levemente repleta, um tanto vazia.
Uma topada num paralelepípedo, em chão mal feito, desalinhado, descascado, desconjuntado
E meu peito ainda assim... leve, pneumaticamente.
Feliz batendo descompassado, passo fora do passo.
Eu por aí, me deliciando desse pedaço mais doce, o pedaço de me sentir leve e me encher de uma sarcástica paz, que me deixa um sopro de soprar, uma topada de acertar, um sentido muito raro de viver.

O amor é uma droga pesada


Como se eu fosse velha muito velha pela milésima vez correndo essas estradas aqui barranco de terra vermelha ali capim-gordura incendiado ao sol a casa pobre bucólica só de longe o gado magro o arame farpado o vira-lata caipira e eu mulher muito velha voltando mais uma vez da viagem sem esferas com minha inútil bagagem de antigos registros sentimentais brasileiros. o amor é uma droga pesada perde-se a exata dimensão da vida e o retorno é lento, cheio de falsas visões cold turkey me quero de volta e que esses matos voltem a fazer sentido sinto falta do mundo sintetizado em sua ordem nos meus pensamentos não esse oco reverberando mandalas nos ossos do crânio não a dissolução de todas as certezas o mundo apenas sua representação me contendo me dizendo a que pertenço afinal o amor é uma droga pesada e eu uma velhíssima mulher gozando pela milésima vez a viagem infernal.

O poema que dá nome ao segundo livro de Maria Rita Kehl, editado em 1983, traz a pulsão da geração de esquerda pós 1968 e expressa, certamente, um dos máximos estéticos deste novo sentimento do mundo.

terça-feira, 13 de maio de 2008


Nunca havia posicionado os meus olhos para enxergar a estreita relação que o narcisismo, ou a cultura narcisista, tem com o despencar da auto-estima que desemboca em melancolia e, em um estágio mais avançado, em depressão. Nem ao menos sabia que as angústias têm ligação com tudo o que é “superestimado” na infância, daí a grande dificuldade do ser humano em lidar com perdas.

O aprofundamento dessas questões está no texto de Luciana Chauí Berlinck, A sociedade do narcisismo e da melancolia, publicado na revista Cult. Extraí apenas um parágrafo, para postar aqui no blog, que me chamou bastante atenção e que, de maneira muito particular, me interessou.
Veja o texto completo: Revista Cult

"Alguns traços permitem pensar a sociedade contemporânea como narcisista e promotora de narcisismo: o gosto pelo efêmero e a perda de referência temporal ao passado e ao futuro; a rápida obsolescência das qualificações para o trabalho, dos valores e das normas de vida e o prestígio do paradigma da moda; a competição como forma de constituição da identidade pessoal; o medo, gerado pela insegurança e pela competição; a perda da autonomia individual sob o poderio do "discurso competente" (a fala dos especialistas); a incapacidade para simbolização e o conseqüente fascínio pelas imagens e pela nova forma da propaganda e da publicidade, que não operam referidas às próprias coisas e sim às suas imagens (juventude, beleza, sucesso, poder) com as quais o consumidor deve identificar-se. Desses traços, a relação com o tempo, e a impossibilidade de simbolização sob o prestígio das imagens são importantes para a determinação da melancolia".

Luciana Chauí Berlinck é psicanalista, autora do livro Melancolia: Rastros de dor e perda (no prelo).

"Homem de Firme Destino - Uma odisséia grotesca rumo ao sul",

Li de um fôlego só e recomendo a leitura deste texto do visceral escritor Márcio Nazianzeno. Com muito humor ele alerta:
"Em todo caso peço para que não deixem para encontrar o amor verdadeiro somente após a morte, quando serão vocês mais respeitados e queridos, que nunca se sabe..."
Você vai abrir uma gargalhada daquelas. Leiam até final.

Por Márcio Nazianzeno.

CAPÍTULO XIV(Onde o herói copula com uma assombração que mais tarde se revela uma prolífica escritora de auto-ajuda).
Naquela noite de lua cheia, nas redondezas do velho castelo do Conde de Langresgraais, um gato preto como a escuridão correu por baixo de uma escada. O episódio, por assim dizer, poderia deixar alguns supersticiosos realmente confusos: se um gato preto, cuja corcunda carrega a encomenda da má-sorte aos outros, acaba ao custo de rara coincidência ele também contraindo algum azar ao passar por baixo de uma escada (o efeito seria o mesmo de dois gatos pretos se entrecruzando em uma esquina) teria ele anulado a maldição? Ou somente potencializado seu efeito, ficando ele mesmo tão azarado quanto os desafortunados com quem encontra? Para o esfomeado Homem de Firme Destino, cujo estômago já começava a digerir o próprio vazio num doloroso processo de autofagia mais física que existencial, era algo que definitivamente não lhe dizia qualquer respeito. Ocorreu-lhe, então, desistir do gato. Além de astuto, o bicho era tão mirrado que de tão magro não lhe renderia nem mesmo uma sopa. Haveria de prosseguir a caçada, o Homem, não tivesse ele a ambição comum somente aos grandes heróis e desafortunados. Eis o que os ventos supõem: a muralha do castelo do Conde de Langresgraais, iluminada pela luz azul da lua, era por si mesma um mistério: uma espécie de cortina a encobrir um todo um universo de possibilidades – dentre elas, a de encontrar um banquete dos mais ricos regado a vinho e carne de caça, gentilmente servido e compartilhado pelas damas da corte – aristocratas, nobres, serviçais, escravas, de origens étnicas as mais diversas – vestidas com seus espartilhos apertados tais máquinas de tortura, e, ainda, sorrindo docemente apesar da carne da cintura brutalmente transferida para partes mais nobres quais as nádegas e os seios. Ora, pois, com o apetite em que estava as devoraria mesmo na mesa, ainda com uma costela de faisão a assobiar entre os dentes, as mãos gordurosas, e assim varreria o vazio do estômago e saciaria ainda seu companheiro, o cavalheiro da retumbante figura: eis aqui a justiça e a igualdade entre irmãos. Mal havia se aproximado do fosso que cercava o castelo, onde anunciaria sua chegada a pedradas, e a ponte levadiça esticou como uma língua de ferro. Sem pestanejar, realizou a travessia como um inseto prestes a ser engolido. Chegando ao pátio, onde o mato era vasto, nada vivo encontrou exceto por alguns morcegos e ratos que logo fugiram. Talvez, disse às paredes, esse amontoado de rochas e insetos fosse de mais valia ao gato preto que, vá lá, também merecia um repasto. E assim, como uma fagulha de esperança, algo se pronunciara à sua frente. Estava ali um soldado medieval de traços marcantes: levemente transparente, de nariz grande e uma machadinha cravada no meio do crânio, que lhe dava, por assim dizer, certo reforço ao seu estilo medieval. Sem mencionar palavra e protegendo a retaguarda, o soldado escoltou o Homem de Firme Destino até o salão principal onde se encontravam os outros de sua estirpe, os fantasmas. O soldado, então, parou. E com o ar mais indiferente desse mundo se desfez em uma espécie de poeira, alcançando um efeito pirotécnico ainda mais interessante que a machadinha na cabeça. O Homem de Firme Destino compreendeu, naquele instante, que o antigo castelo do Lorde de Landergaais havia se rendido não às guerras e a guerreiros, mas à fúria dos tempos modernos, que lhe transformou em hotel que, embora medieval, era ainda assim somente um hotel, freqüentado por fantasmas de nobres, aristocratas e etc. dos mais longínquos séculos em busca de entretenimento vazio e barato. E, assim, quando estavam entediados demais, eles arrastavam pelo castelo suas grossas correntes, derrubavam objetos pela casa ou simplesmente percorriam os cômodos para abrir e fechar portas rangentes – porque assim se sentiam vivos, como quando não podiam simplesmente atravessar as paredes. Pois bem: portas rangiam, correntes eram arrastadas e objetos flutuavam no ambiente quando avançou pelo salão o Homem de Firme Destino, o obstinado, que logo cravou os dentes na massa de ectoplasma de uma entidade que ali na sua frente estava a se materializar: possuído pela fome, terminou por devorar a perna esquerda da antiga Condessa de Langresgraais. Foi então que, tentando contornar a situação em que acabara de condenar uma alma penada a vagar pela eternidade sem uma das pernas, uma falta de modos descomunal, diga-se, tratou de recompensar a assombração com o mais intenso prazer carnal. Sussurros sensuais & sombrios, gemidos lamuriosos ensandecidos, arrepios em cada pêlo de seu magro corpo; com o da retumbante figura a deferir violentas estocadas na massa translúcida como se flutuasse nas nuvens – estava a currar a assombração com invejável empenho. Os mais supersticiosos, deixando um pouco de lado a problemática do gato preto e a escada, passariam então a discutir as questões éticas do sexo entre corpo e espírito. Mais tarde o caso ganharia maior atenção e popularidade com os best-sellers de autoria da própria Condessa, que se revelou uma prolífica escritora dos maiores livros de auto-ajuda jamais psicografados. Dentre seus sucessos, podemos destacar os inconfundíveis “Porque humanos fazem sexo e fantasmas fazem amor”, “Sexo após a morte: uma questão de espírito”, “Morri. E daí?”, “A vida começa aos 670” e o polêmico “Na cama com Deus – As revelações da Condessa de Langresgaais”. A autora, que jamais obteve sucesso em vida, nega os boatos sobre a existência de um ghost writer.
Acreditem ou não, foi assim que, naquela noite de lua cheia nas redondezas do castelo do Conde de Langresgraais, o Homem de Firme Destino provou que não existe obstáculo suficientemente grande para o amor. Em todo caso peço para que não deixem para encontrar o amor verdadeiro somente após a morte, quando serão vocês mais respeitados e queridos, que nunca se sabe...

quinta-feira, 8 de maio de 2008

SHOPBAGS


Não há como resistir às sacolas ecologicamente corretas, shopbags, ou ecobags, por inúmeras coisas que são extremamente relevantes para a sustentabilidade do planeta e pra nossa “bossa”, claro, e, não apenas, mas pelo fato de serem descoladas e possíveis de personalizar, customizar. Para nós publicitários, uma alternativa para incrementar as ações dos nossos clientes, sugestão de brinde, distribuição em eventos, entre outras tantas opções. A maioria das empresas se engaja realmente pra aliar a marca a projetos e atitudes de preservação do meio ambiente. A dica está dada, é só entrar o blog Pedaço de Amor um ateliê que já desenvolveu algumas, em parceria com a publicitária Suzana Santos Rossi. As sacolas são confeccionadas em Algodão Cru externamente, muitas vezes com a logomarca do cliente, ou apenas desenhos divertidos, e internamente em tecido estampado 100% algodão. Está tudo lá.
Para quem gosta ou mesmo sem gostar, vai ao supermercado, está mais do que na hora de levar sua própria sacola e esnobar as capengas e tóxicas sacolas de plástico. Se você gosta de se exibir até fazendo feira (rs), veja as sacolas no site "coisas da doris".