segunda-feira, 15 de setembro de 2008

DOCE



Por Telga Lima

Ele tem os pés sensíveis.
Sente tanta cócega, uma sensação particular, ora deleitosa, ora irritante, que provoca movimentos ou risos compulsivos, que nem ao menos sabe aonde vão parar suas pernas, se alguém, mesmo que de maneira descuidada, deslisar os dedos por essa sua parte do corpo tão delicada.
Ele tem jeito de casa de livro de histórias, que fala tão eloquentemente, que é difícil não perguntarmos, como alguém pode ignorá-lo.
Ele é todo doce, de um doce pra quem tem paladar apurado, requintado, refinado. Um doce cor de pêssego.
São doces os seus pés, de tão sensíveis.
Seus lábios também são doces, de uma voz suave que a qualquer hora do dia, eu posso passear lá fora e ouvir pássaros cantando.
A começar pelos pés, eu poderia passar um dia explorando cada recanto, descobrindo que novas coisas há para se ver.
Ele me toca e eu sinto.
Ele é doce de uma forma quase alimentadora.
Ele é tão doce que me deixa tentada a sentar num canto e me deixar impregnar com qualquer que sejam os fluidos, aqueles que me fazem sentir tão tranquila.
Os meus músculos relaxam indicando acessos interiores, viscerais, cinestésicos.
Ele é tão doce que eu sinto a brisa sussurrando através dos galhos, docemente.

segunda-feira, 8 de setembro de 2008


Foto do meu aniversário na Dois.a Publicidade. Hummm!! Foi muito bom.
Éricka - Adriana (a sujeita) - Raquel (a carioca!) - Sheline - Eu - Bethânia

Foto no churrasco de aniversário de Marcilio Neto (Mariz Cominicação)!!! êbaaaa.
Éricka - Tássia - Eu - Katiane



Entre chá de bebê e "A Culpa é de Fidel", o final de semana foi bárbaro.
Revi algumas queridas amigas, no chá de bebê de Tomás filho de Mileufis. Rimos muito juntas relambrando momentos inesquecíveis e engraçadíssimos.
Muiiiiiiiiiiiiiiitas grávidas!!! Além de Milena, que está com um barrigão de oito meses, Luciana também me aparece redondinha.
O tempo passa e com ele vem as surpresas e alegrias da vida. Bom saber que elas agora se preparam para ser mães, donas de família. Sinceramente fiquei emocionada.
Sem chá de nenhuma espécie (rs), comemos todas as guloseimas da festinha e certamente voltei pra casa uns quilinhos mais gorda (rs). É muito feliz também.
Antes de ir ao "chá", fui correndo, literalmente, pois acordei em cima da hora pra sessão cult do Cinemark, ver "A Culpa é de Fidel". Gostei muito do filme e indico.
Apesar da crítica é um filme que provoca algumas boas risadas, reflexões políticas e familiares. Tudo gira em torno da percepção de Anna, uma criança de apenas 9 anos que cresce no seio de uma família rica. Anna, depois de um certo tempo, começa a conviver com os ideais comunista de seus pais, sendo obrigada a perceber um novo mundo, diferente do que estava acostumada a enxergar.
Em algum momendo do filme aparece, meio que sutilmente, o tema aborto e lembrei-me de um texto de Márcia Tiburi que postei logo abaixo. Respirem e leiam!

Ficha do Filme
Título original: La Faute à Fidel.
Actores: Julie Depardieu, Stefano Accorsi, Nina Kervel, Benjamin Feuillet, Gabrielle Vallieres.
Realizador: Julie Gavras.
Argumento: Julie Gavras.
Género: Drama.
País: França, Itália


ABORTO


Aborto, soberania e mudez das mulheres *
Marcia Tiburi


Um dos aspectos mais interessantes quando se discute o aborto hoje é o fato de que os principais participantes da discussão são homens. Os mesmos que - é preciso dizer - nunca irão parir, jamais serão mães, não abortarão. Eles falam, enquanto as mulheres fazem. Não devemos com isso supor que os homens não deveriam participar de tais discussões, mas perguntar por que a palavra dos homens se mostra prevalente nesta questão. Devemos perguntar por que eles parecem mais interessados do que as imediatamente interessadas que continuam fazendo ou não seus abortos, tendo ou não seus filhos. A contradição entre o discurso dos homens e a ação praticada mulheres é o que precisa ser levada a sério. Ela pode ajudar a explicar porque o aborto não foi legalizado no Brasil e nem será em países onde as mulheres são, em sua maioria, pobres e desprovidas de poder. Por que as mulheres esperam caladas por todas as decisões políticas, inclusive às que as tocam diretamente?

A legalização do aborto não virá dos donos do poder e dos discursos que comandam e decidem sobre o corpo das mulheres. Elas, em silêncio, agem como se não fossem donas e senhoras de seus corpos. E, de fato, não o são enquanto continuam na velha economia da sedução, da prostituição, da maternidade, da vida doméstica, do voyerismo do qual são a mercadoria. Que as decisões sobre seus próprios corpos não pertença às mulheres é uma contradição que poucas podem avaliar. Não ter voz significa não pertencer à política. À medida que não participam e nem percebem o quanto estão alienadas da conversa, as mulheres perpetuam a injustiça que as trouxe até aqui. Em última instância, estão distantes da ética que envolve a decisão sobre seus direitos e sua própria vida.

Além disso, a questão do aborto sinaliza que a liberdade das mulheres - prisioneiras ancestrais de uma estrutura social que tem sua lógica - está sempre vigiada. Que nossa sociedade seja patriarcal significa bem mais do que dominação dos homens sobre as mulheres. Que estas sejam vítimas e aqueles algozes. Mas que o patriarcado depende da ausência de democracia na qual os direitos das mulheres venham à luz.

O que realmente assusta quando se fala em aborto é o que virá com a fala das mulheres e que dia após dia é praticado em silêncio nas clínicas deste país. É o fato e a prática cotidiana que se realiza de modo soberano ainda que clandestino. A soberania daquele que emite uma opinião fundamentada em seu próprio nome e por sua própria voz é análoga à soberania que uma mulher pode ter sobre seu corpo. Aquele que pode falar pode fazer porque cria, por meio de sua fala, valores, relações e consensos. Aquela que fala em seu próprio nome manifesta a possibilidade universal de que muitas a sigam ou simplesmente saiam da clandestinidade, única forma pela qual mulheres podem ser soberanas sobre seus próprios corpos sem correrem riscos na ordem moral e legal. É esta soberania das mulheres que assusta. Por isso, ela permanece na clandestinidade.

A ausência histórica de autorização para a fala e, assim para o poder, é elemento fundador do lugar ocupado pelas mulheres na sociedade. A fala das mulheres causa angústia e temor na ordem. Que mulheres possam tomar suas decisões e sejam amparadas pela justiça é algo que uma sociedade que se construiu pela submissão das mulheres e pela superioridade dos homens não pode suportar sem uma ampla renovação dos costumes.

Hoje, as mulheres que possuem algum poder proveniente do dinheiro ou da liberdade sobre a própria vida, praticam o aborto soberanamente. As que não tem poder algum – nem aquisitivo, nem intelectual, nem qualquer outro poder que garanta a autoconsciência quanto à pertença de seus corpos – são vítimas de uma sociedade que não prevê espaço para uma prática que deveria ser medida a partir da soberania da mulher sobre seu corpo e sua vida. Homens desde sempre souberam disso e imperaram sobre seus próprios corpos e sobre todos os corpos que lhes prestaram serviços, também os corpos de seus empregados, de seus filhos e filhas.

Perder o exercício do poder sobre o corpo das mulheres é o que assusta homens de mentalidade arcaica hoje em dia. Assusta as instituições autoritárias. Ter soberania sobre o próprio corpo talvez também não interesse a todas as mulheres, pois isso exige uma responsabilidade para a qual talvez não estejam individualmente preparadas.

* Originalmente publicado na Folha de São Paulo , 26 de julho de 2007, coluna Tendências/ Debates, A3.