sexta-feira, 5 de junho de 2009

Amar, verbo em transição.


Por Telga Lima

Inevitável. Não há mais como voltar no tempo e pintar todas as telas com a monocromática cor de rosa. Resgatando a canção de Rita Lee que diz, é cor de rosa choque, a cada dia estou mais convicta que o universo feminino ampliou a sua cartela de cores. Nada mais é básico, nem o que nos veste, nem o que nos despe. Estamos reinventando, o modo, o tempo, a maneira, a forma, o contexto. Armadas com nossos soutiens ou deixando-os queimar em uma fogueira, a proposta continua sendo "liberdade", de individualidade, de experimentos, de vida sem padrão. Estamos saindo da embalagem, "sartando fora", para conseguirmos uma vida sem culpa e sem tantas frustrações. Nestas comemorações que antecedem o dia dos namorados é importante que se faça uma reflexão, sobre a vida a dois e a vida a um, de modo que o importante é estarmos sentados confortavelmente na poltrona dos nossos desejos reais, sem fantasias e felizes.


Vejam o que dizem os especialista nesta matéria da revista Bons Fluidos, deste mês.
Amar, verbo em transição.
Mudanças à vista
Vivemos uma fase de transição. Ainda estamos apegados ao ideal romântico e, ao mesmo tempo, desejamos construir uma relação a dois mais autêntica, com mais liberdade e menos requisições. Isso só poderia resultar em confusão e contradição.
A psicanalista e sexóloga carioca Regina Navarro Lins acredita que os encontros e desencontros amorosos protagonizados por muitos de nós criam um vácuo, amedrontador, sim, mas potencialmente benéfico, se o enxergarmos como um espaço criativo de onde podem surgir – e, segundo ela, isso já está acontecendo – mudanças significativas na nossa forma de encarar os relacionamentos.
Segundo Regina, o amor romântico começa a dar sinais de que está saindo de cena, levando com ele o ultimato de exclusividade, desde sempre, seu pilar de sustentação. “Estamos descobrindo como é fundamental voltarmos para nós mesmos a fim de desenvolvermos nosso mundo interno. Acontece que a lógica do amor romântico, apoiada em expectativas, idealizações e dependência, é contrária aos novos anseios individuais”, avalia Regina.
No seio desse jogo de forças opostas – parceria x individualidade, fragilidade x autonomia –, o amor está sendo remodelado. Cada vez mais pessoas acreditam que o poeta Vinicius de Moraes está desatualizado e garantem que é possível, sim, ser feliz sozinho e desfrutar de uma vida plena, recheada de interesses e projetos de todas as ordens. A parceria amorosa não precisa ser excluída desse pacote. Muito pelo contrário. Ela só tem de ser reconfigurada, entrar como algo mais. Tarefa que exige a fabricação de uma roupagem mais realista, o que não significa dizer, é bom ressaltar, menos envolvente e satisfatória.
Se antes as volúpias da paixão ditavam as regras entre os enamorados, hoje, a sede de autoconhecimento e crescimento pessoal está falando mais alto e, consequentemente, mudando a maneira de nos relacionarmos. Segundo Gikovate, essa força curiosa e libertária mais cedo ou mais tarde faz apitar o sinal de reabastecimento de nossos compartimentos individuais. Nesse momento, lembramos que é hora de nos afastarmos um pouco dos projetos a dois em favor de nossos próprios interesses.
Cada vez mais as pessoas estão percebendo a importância desse movimento rumo à individualidade, apontam as pesquisas. Ficar sozinho também já não é mais motivo de vergonha. O preconceito não está mais localizado na sociedade, que outrora estigmatizava o estar só como sinônimo de fracasso. Já dentro de nós as cobranças teimam em nos atormentar. “O problema são as nossas crenças, coisas que vieram de fora, sobretudo das gerações anteriores, e estão enraizadas no nosso modo de pensar”, analisa Gikovate. Como exemplo, ele cita a crença, ainda viva em muitas mulheres, de que é menos constrangedor ser divorciada, pois, pelo menos, o casamento existiu um dia, do que solteira – para elas, um atestado de rejeição. Ou, se preferir, um pesadelo.
Apesar da persistência entre nós de pensamentos como esse, o cenário nunca foi tão propício à individuação. A parceria amorosa, nesse novo contexto, passa a ser um acidente de percurso, muito bem-vindo por sinal, e não mais um bote salva-vidas, o único remédio para a dor do abandono que nos acompanha desde o nascimento. Não se esqueça de que um dia fomos expulsos do útero materno, o protótipo do paraíso, onde nossas necessidades vitais eram atendidas sem o menor esforço. Para o psiquiatra, pessoas bem resolvidas com as dores e os prazeres da vida têm, pelo menos, três caminhos a seguir: descobrem as delícias da solidão e se mantêm sozinhas, mas nunca solitárias, ou alternam fases em que estão bem acompanhadas e outras em que voltam a ser solteiras sem drama, apenas porque as relações que viviam não ofereciam mais possibilidades de evolução. A terceira situação ainda é a mais almejada – uma parceria duradoura e serena, um tipo mais evoluído de relacionamento que o psiquiatra batizou de + amor. “O + amor aproxima-se da amizade no que se refere à solidez, à confiança, ao respeito aos direitos do outro, à preservação das liberdades e dos desejos individuais. A outra face se aproxima da paixão, pois a intensidade da intimidade é máxima.” Algo como “um amor tranquilo, com sabor de fruta mordida”, para citar um belo verso de Cazuza.

“Temos de nos livrar da crença, presente e potente em nossa cultura, de que o amor romântico é o caminho que abre todas as portas da felicidade”
Flávio Gikovate, psiquiatra

“Daqui a algum tempo, é difícil precisar se em dez, 20 ou 30 anos, menos pessoas vão querer se fechar numa relação a dois”
Regina Navarro Lins, sexóloga.
Leiam na íntegra: Bons Fluidos

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